Folhetim

28 março, 2009

 

PEÇAS FRAGILIZADAS

No primeiro capítulo de PEÇAS FRAGILIZADAS Alyrio vai a um hotel de luxo para encontrar seu cliente. Na conversa ele fica sabendo que Joca é um matador, além de ser um dos expoentes do mundo das drogas. Matou um empresário dos transportes da cidade de São Paulo e foi bem pago por isso. Ao perceber que todos os envolvidos naquele caso estavam morrendo, quer que Alyrio desvende os pontos obscuros. Com isso, sua amiga Valdeci vai escrever um livro. Joca acredita que obtendo as informações corretas, estará se livrando da morte.Se você ainda não leu os capítulos anteriores, estão no ARQUIVO, no final desta publicação.



QUARTO CAPÍTULO


Alyrio fez várias ligações. A primeira dificuldade era chegar ao dono ou responsável pela empresa. A segunda era convencer o sujeito a receber um detetive. Depois de diversos telefonemas e muita argumentação, conseguiu duas entrevistas para aquela tarde e três para o dia seguinte. Iria tentar mais um pouco, mas George retornou, informando que estava faminto.

- Que tal experimentar um restaurante que acaba de inaugurar? – Ele estava postado em frente a escrivaninha e Alyrio sabia que seria impossível continuar trabalhando.

- Vamos lá! – Alyrio levantou-se e os dois saíram.

As escolhas de restaurante sempre ficavam por conta de George. Quando o assunto envolvia boas refeições, era ele quem sabia as novidades e as melhores opções. Os dois caminharam até o restaurante. Naquela hora, as ruas estavam lotadas de gente que saía dos escritórios para almoçar. O restaurante estava bem cheio. Conseguiram uma mesa e pediram o chope. Os dois pegaram seus pratos e deram uma volta ao redor do bufê para ver o que havia. Foi somente na segunda volta que selecionaram e colocaram no prato o que iriam comer. Quando se sentaram, o chope já estava sendo servido.

- Saúde! – George levantou o copo. – Pelo menos o pessoal aqui é eficiente em servir a bebida! Isso é um bom sinal!

Os dois sorveram o primeiro chope e pediram o segundo.

- É preciso estar sempre atualizado quanto aos restaurantes da área! – George comentou. – Acho importantíssima essa pesquisa de bairro, conhecer tudo o que existe ao redor de onde trabalhamos!

Alyrio sorriu concordando e por algum tempo os dois se dedicaram à comida.

- Enquanto selecionava as empresas de transporte, me lembrei bem desse caso. – Diante do prato vazio, George voltou a falar. - Foi um caso que acompanhei pelos jornais e senti que havia muito mais do que a imprensa noticiou. Parece que pediram sigilo nas investigações e muita coisa ficou obscura.

- Com certeza vai ser emocionante! Jamais trabalhei para um assassino confesso e muito menos para que se escrevesse uma história! – Alyrio tentou um sorriso.

- Coisas do mundo moderno! – George balançou a cabeça e em seguida levantou-se para se servir mais uma vez, ao retornar falou:

- Enquanto me servia de peixe, lembrei de uma coisa. O nome do assassino narcotraficante é Joca?

- Isso mesmo. – Alyrio concordou.

- Ele deve ter muita história para contar! Esse cara foi preso exatamente quando outro dos chefões estava preso. Os dois estavam na mesma cadeia, começou uma rebelião e ninguém sabe como um deles foi assassinado. Joca foi o que sobrou e domina boa parte do narcotráfico da cidade. Não é à toa que ele é o chefão! E se ele está com medo... a coisa está feia mesmo! – George atacou o novo prato.

- O negócio do narcotráfico é um dos mais rentáveis do mundo. E ninguém tem problemas quanto a subir na empresa. A posição é conseguida matando o adversário! Sem complicação ou frustração! – Alyrio terminou seu chope.

- Experimente o peixe com molho de alcaparras, está excelente! - George sugeriu.

- Ultimamente todos os casos que eu pego têm envolvimento com droga! Isso não vai ter fim! – Alyrio olhou o peixe, mas não se animou.

- Além de ser muita grana envolvida, a sociedade moderna leva cada vez mais pessoas para a droga.

Alyrio limitou-se a olhar para George que continuou:

- A sociedade de consumo leva as pessoas a desejarem cada vez mais coisas. Você acaba de comprar um carro novo e já deseja outro. Arruma uma mulher boa e interessante e na segunda transa perde o tesão e quer outra. Mulheres acabam de comprar uma roupa que nem sabem se vão usar e já querem outra. Os poderosos querem cada vez mais grana e poder! Todo o mundo vive descontente, depressivo. E nesse mundo de descontentes e insaciáveis, o viciado é o único que sabe exatamente o que quer! Ele quer droga! Ele precisa de droga!

Alyrio surpreendeu-se com aquela idéia tão simples e precisa. Realmente o drogado é o único na sociedade que sabe exatamente o que quer e o traficante estava sempre próximo para fornecer.

- Então Joca matou o concorrente! – Alyrio sorriu. - Posso dizer que estou lidando com gente que não brinca em serviço!

- É bom tomar cuidado! – George olhou-o com os músculos da testa levantados.

- Vou tomar muito cuidado, mas não vou seguir sua sugestão de experimentar o peixe. – Alyrio olhou o relógio. – Preciso começar as entrevistas! Foi muito difícil conseguir ser atendido. Não posso chegar atrasado.

Os dois se levantaram, passaram pelo caixa e pagaram. Caminharam até o escritório. Naquela hora o sol conseguia vencer as nuvens, mas um ventinho gelado não deixava dúvidas de que o outono começava a se instalar. No caminho, foram esbarrando por camelôs que vendiam de tudo. Por mais que caminhassem pelos arredores do escritório, Alyrio e George jamais se acostumariam à visível degeneração do centro da cidade. Às margens do mar de gente que circulava, eram mendigos que dormiam no chão, mães que levavam crianças de colo para penalizar os transeuntes, vendedores de CDs e DVDs piratas, vendedores de todo o tipo de bugiganga fabricada na China, pedintes, homens que vestiam anúncios.

- Tenho de passar em casa para pegar meu carro. – Alyrio falou diante do edifício em que ficava seu escritório. – Você disse que estava com tempo livre. Dá para me fazer um favor?

- Diga.

- Ligue para esse número e tente marcar uma entrevista com Dr. Zenon. - Alyrio tirou um papel do bolso e entregou-o a George. – É o advogado que acompanhou a autópsia de Nelson. A secretária informou que horário para novos clientes é para daqui a um mês! Não tive tempo de usar meu charme para conseguir abreviar esse tempo. Tenho certeza de que você vai conseguir!

- Vou tentar! Faço também uma busca pela internete. Se ainda existir algum artigo sobre o caso, envio para você por e-mail. – George entrou no edifício.

Alyrio caminhou até a estação de metrô. Fez as baldeações e saiu na Paulista, na estação Consolação. Caminhando em direção à sua casa passou por um imenso taxo sobre um butijão de gás, onde um asiático preparava Yakisoba no meio de um mar de gente. Havia uma fila de pessoas esperando sua porção, enquanto o homem virava e revirava com muita habilidade uma montanha de macarrão. Alyrio balançou a cabeça pensando na resistência que as pessoas que comiam aquilo precisavam ter para vencer os germes e toda a poluição que ia caindo e se misturando aos legumes, carnes e ao macarrão. Caminhou mais um pouco, chegou até sua casa e pegou o carro.


Escrito por Vera Carvalho Assumpção  em6:41 AM 1 comentários

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